No dia 18 de Outubro realizou-se na BECRE um seminário, para apresentação das atividades do projeto "E o céu aqui tão perto /Diálogo entre Ciência e Literatura aos alunos do 10º2 e 10º6, seguido de um lanche temático (O Universo também se come..).
Convidámos o Rui Bastos, que foi aluno da nossa escola e colaborador muito ativo do LCV e que agora está no IST no curso de Engenharia Biomédica, para apresentar uma comunicação sobre o tema do projeto.
O Rui fez uma excelente comunicação, que foi seguida com bastante interesse por todos os participantes e que a seguir transcrevemos.
Se quiserem espreitar o lanche:
http://www.facebook.com/media/set/?set=a.365603490190657.87170.100002230263987&type=1
Ciência e Literatura
As diferenças entre a Ciência e a Literatura
dificilmente podiam ser maiores. Se por um lado as Ciências exigem rigor,
objectividade e o seguimento de regras exactas, as Letras são muito mais
liberais, subjectivas e com uma certa tendência para o desprezo pelas regras. E
no entanto são duas áreas que não só se misturam frequentemente, como o fazem
facilmente, devido a uma série de pontos comuns que as ligam apesar das
diferenças.
Por exemplo, de um
lado temos a Matemática e do outro a Poesia. Duas coisas tão absurdamente
diferentes que a maior parte das pessoas falha por completo em ver as
semelhanças. Afinal, o que é que Euler e Gauss podem ter a ver com Pessoa e
Poe? Aparentemente, nada. Mas qualquer professor de Matemática que se preze vos
pode falar da beleza quase poética que a Matemática pode ter, assim como
qualquer professor de Português vos pode atormentar com o rigor quase
matemático que a Poesia pode ter.
Ou seja, não é
complicado. Literatura e Ciência, Ciência e Literatura… Uma coisa não exclui a
outra, antes pelo contrário. E há uma área em particular que é tão misteriosa e
tão sublime que só um esforço conjunto destas duas áreas a pode entender
minimamente. Falo da Astronomia. É impossível compreender o Universo sem fazer
uso de uma Física extremamente complicada que escapa ao entendimento da maioria
das pessoas, mas é também impossível descrever as maravilhas nele contidas sem
ter que recorrer à subjectividade e criatividade específicas das Letras.
É complicado de
perceber e de conceber que nós e tudo o que nos rodeia é constituído por
elementos químicos que foram formados em vários tipos de reacções no coração de
uma estrela, mas se a acompanhar isto se disser que “somos todos feitos de
poeira estelar”, pouco mais é preciso dizer. Por outro lado, tentar explicar
por palavras o que é um buraco negro ou o que é o infinito não é fácil, mas há
equações que descrevem o primeiro e trabalha-se frequentemente com o segundo
nos diversos ramos da Ciência.
Pessoalmente acho
que é algo complicado de explicar, mas a Astronomia, para mim, é um exemplo
perfeito da união e da complementaridade de ambas as áreas. Ainda para mais
quando essa sintonia resulta num género literário como a Ficção Científica, do
qual sou um aficionado e que já me providenciou das melhores leituras da minha
vida. Livros como 2001 – Odisseia no Espaço, de
Arthur C. Clarke, são para lá de geniais… Este em particular é uma verdadeira
obra-prima da literatura, com algumas das melhores descrições do espaço que eu
já li. A forma como o autor nos faz viajar por entre as estrelas, como se
estivéssemos de facto a espreitar pela janela de uma nave espacial é divinal. E
o livro tem um rigor científico fora do comum para uma obra de ficção.
Já para não falar
de Júlio Verne e dos seus livros Da Terra à Lua e À
Roda da Lua, com uma Ciência minimamente plausível e
descrições espaciais, nomeadamente lunares, simplesmente fascinantes e
perfeitas. E a quantidade de livros sobre os quais ainda podia falar torna
ridícula a ideia de que a beleza não existe na Ciência, ou de que a Literatura
é incapaz de captar a sua essência. Porque ambas as áreas não passam de duas
faces da mesma moeda, ou de duas abordagens diferentes para fazer exactamente a
mesma coisa: perceber o Mundo que nos rodeia.
Isto leva a que da
mesma forma que posso dizer que há poucas coisas tão diferentes como a
Literatura e a Ciência, posso também afirmar sem qualquer peso na consciência,
que é ainda mais complicado encontrar duas coisas que sejam, ainda assim, tão
semelhantes.
Rui Bastos